domingo, 18 de outubro de 2020

O ignorante feliz

 

Ignorante é aquela pessoa que, por inúmeras razões, ignora/desconhece algo ou alguma coisa. Nossa crônica, no entanto, não pretende discorrer sobre esses homens e mulheres que, mesmo desconhecendo muita coisa, não podem jamais serem colocados na categoria de “estúpidos”, pois conhecem outros mundos e possuem uma sapiência que não se enquadra naquilo que a educação formal compreende como conhecimento. Esse tipo de ignorante não guarda aproximações com o ignorante feliz.

O ignorante feliz é aquele tipo de gente que tem orgulho da sua estultice. Em meio a uma pandemia, por exemplo, mesmo tendo-se a orientação de ficar em casa em quarentena, o ignorante feliz decide que deverá sair em carreata em defesa do indefensável. O ignorante feliz, como dizem os norte-americanos, é um loser, ou seja, um perdedor, um fracassado, mesmo que seja rico, muito rico. O ignorante feliz se orgulha de jamais ter lido um livro. Informar-se por meio de aplicativos de mensagens já é o suficiente para ele, não se importando se são mensagens verdadeiras ou falsas. O importante mesmo é passá-las adiante. O ignorante feliz acha que escola, praia, jornal, macaco, carro e livro é tudo a mesma coisa. Para ele, tudo isso é coisa de esquerdista. E grita a plenos pulmões: “nossa bandeira jamais será vermelha”. A quem achar ruim, grita mais forte: “vá pra Cuba!”. Ao pobre vocabulário do ignorante feliz a “elite” predatória brasileira adicionou lexias como “petralha, esquerdopata, comunista, ideologia de gênero, mamadeira de piroca” etc, as quais são regurgitadas pelo ignorante feliz toda vez que sai do curral, para uma voltinha na cidade.

O ignorante feliz ainda é do tempo em que se seguiam gurus. Rasputin se remexe na tumba. O ignorante feliz sabe que há um mínimo que precisa saber, para compreender por qual razão ele é um ignorante. O ignorante feliz adora ver capas de livros de astrólogos e gurus. O ignorante feliz, sim, é parente muito próximo do idiota útil. Quando juntos, constituem o que se chama de imbecil coletivo. O ignorante feliz acha que é rico, quando está apenas sendo usado pelo ignorante feliz rico. Mas ele, sorrindo amarelo, finge que não sabe.

Para o ignorante feliz, “bandido bom é bandido morto”. Bandido preto e pobre, claro. O ignorante feliz não sabe, e tem raiva de quem sabe, quem é Chomsky. O ignorante feliz jamais lerá O mestre ignorante, de Jacque Rancière. O ignorante feliz não sabe como as democracias morrem. O ignorante feliz não soube da morte do autor. Foda-se! diria ele. O ignorante feliz se autodenomina um “cidadão de bem”. É, como diria Belchior, um cidadão comum, como esses que se vê na rua. Fala de negócios e vê show de mulher nua. De dia, o ignorante feliz é defensor da tradicional família brasileira e dos bons costumes (seja lá o que isso queira dizer), mas à noite “todos os gatos são pardos”. O ignorante feliz rosna pelo direito de possuir uma arma, quando não consegue pagar nem as próprias contas. O ignorante feliz põe sua camiseta da seleção brasileira para ver lives de cantores sertanejos que, assim como ele, acreditam em mitos e em messias com armas na mão.

O ignorante feliz é um ser atormentado que, por suas observáveis aflições, poderia muito bem constar no tríptico de Bosch, o Jardim das Delícias Terrenas ou no Inferno, da Divina Comédia, de Dante. O ignorante feliz acredita que as instituições democráticas devem ruir, para que se instale a democracia. O ignorante feliz é intolerante, preconceituoso, misógino, xenófobo, homofóbico, velhofóbico e contra tudo o mais que não caiba nas limitações da sua cabecinha de bola de gude, controlada remotamente por robôs e trolls. O ignorante feliz é feliz no seu vazio existencial.


sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Eis o candidato na praça outra vez

 

Para o bem de todos e felicidade geral da nação já está aberta a temporada de campanha eleitoral. Infelizmente, por causa da pandemia, haverá uma diminuição considerável de apertos de mão, crianças nos braços e tapinhas nas costas, entre outras demonstrações de carinho e calor humano. A ausência total ou a diminuição destes afagos pode aumentar a “fadiga da pandemia”, pois, como o eleitor vai conseguir viver sem tais afetos, não é mesmo?

As cidades, por sua vez, já sentem os efeitos das campanhas. Não importa por onde se passe, lá estão eles, os santinhos dos candidatos e candidatas a inundar com suas retóricas vazias, nomes exóticos e imagens bizarras; os canteiros centrais das avenidas, bueiros, para-brisas de automóveis, caixas de correio e frestas de desavisadas janelas.

Uma olhada rápida na lista de candidatos e candidatas constata que, entre tantos nomes, muitos são velhos conhecidos de guerra, outros tantos são novatos e outros são só sem- noção mesmo. Os tipos são os mais variados possíveis. Tem-se, por exemplo, a “dona fulana do postinho”, “sargento beltrano”, “pastor sicrano”, “o lindão da padaria”, “a amiga de sempre” etc. Em meio a tamanha diversidade, há aqueles candidatos que são reconhecidos por sua capacidade de hibernar, despertando somente a cada quatro anos, quando lembram que o povo existe e que suas contas bancárias precisam ser irrigadas. O pior dessa história é quando o eleitor ignora aqueles que representam e defendem sua comunidade, optando por candidatos que, passada a eleição, sumirão como num passe de mágica.

O candidato é um espécime curioso, sempre atento àquilo que lhe interessa. Seus movimentos são calculados e seu discurso costuma ser bem articulado, moldado em um número limitado de palavras que podem ser arranjadas para discorrer, bem ou mal, sobre qualquer que seja a temática. Quando não consegue responder sobre um determinado assunto, o candidato responde sobre outro, colocando em prática suas aulas de coaching e media training. Ao caminhar, o candidato procura apresentar uma postura firme, não necessariamente com barriga pra dentro e peito pra fora, mas tentando demonstrar liderança, empoderamento e altivez. Como nem sempre consegue, o candidato acaba andando assim, de viés.

Em época de campanha eleitoral o candidato não conhece limitações; anda por toda a cidade, sobe e desce morro, invade ônibus, trem e metrô, distribuindo sorrisos e santinhos a tudo aquilo que se mova. E se o eleitor está na feira, praia, mercado, igreja ou bar; lá também estará a figura onipresente do candidato. Entre tantos tipos, um dos mais comuns é o “Candidato caô caô”, como na canção de Walter Meninão e Pedro Butina, que em tempos de eleição sobe o morro sem gravata, bebe cachaça na vendinha, toma água da chuva, fuma bagulho e usa lata de goiabada como prato. Quando se vê isso, dizem os poetas, não resta dúvida, é mais um candidato às próximas eleições.

Assim, conforme dados do TSE, são 750 mil candidatos tentando uma vaga para os cargos de prefeito e vereador em todo o país, disputando o voto de 147, 9 milhões de eleitores. Nas eleições de 2020 serão eleitos 5.568 prefeitos, com seus respectivos vice-prefeitos e 57.942 vereadores. O eleitor que se proteja, pois os candidatos já estão na praça outra vez.


quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Aqueles que queimam livros

 

Quando a pandemia nos empurrou para o isolamento, passamos a ouvir de forma recorrente a pergunta: “ao término da pandemia, sairemos pessoas melhores ou piores?”. Chegados aos sete meses de pandemia, com um milhão de mortos no mundo todo, sendo quase 150 mil somente no Brasil, percebe-se que, se havia alguma dúvida de como sairíamos da quarentena, a resposta já nos parece bastante óbvia, com a normalização do  absurdo, a saber, praias cheias, shoppings e bares lotados, ruas e praças movimentadas. E assim, em nome do grande deus mercado, fomos apresentados ao “novo normal”, pois a economia não pode parar. Se morreu, morreu porque que tinha que morrer, diriam alguns cidadãos e cidadãs de bem.

Os que defendem coisas desse tipo são, na maioria das vezes, pessoas que também costumam bradar dizeres em defesa da família tradicional brasileira, professar alguma fé e responder com a palavra “gratidão” a cada mensagem que recebem. Algumas vezes, protagonizam cenas que fariam corar de horror, vergonha e repulsa até um frade de pedra, estejam tais pessoas em carros conversíveis, ruas ermas ou restaurantes bregas e caros. O cavalo-de-pau (ou seria aquele grande acordo nacional?) que deram no Brasil, colocou-o “Titanic” de cara para um abismo que, mais cedo ou mais tarde, o engolirá. O que se vê, no entanto, não é nada mais nada menos que o resultado de trezentos anos de escravização, criminalização dos menos favorecidos socialmente e do projeto de destruição da educação brasileira.

Assim, a cada novo dia somos tomados de indignação e espanto diante do caos que se alastra por aqui, transformando o Brasil em um arremedo de nação, numa Sucupira, uma Bruzundanga fascistóide. Das inúmeras bizarrices da semana, nos chamou a atenção o vídeo que mostra dois idosos queimando os livros do escritor Paulo Coelho na churrasqueira de casa. Ao ser questionada pela pessoa que filma acerca da razão do ato, a velha senhora diz que ele, Paulo Coelho, teria pedido “pra não comprarem os produtos do Brasil, lá fora falando mal do Brasil. Agora eu estou aqui queimando os livros dele, miserável”, disse. E, parafraseando Darcy Ribeiro, nos perguntamos: como o Brasil deu no que deu?

Inaceitável, por seu caráter bárbaro, a atitude dos idosos é pra lá de criminosa em um país carente de livros e leitores, sendo, além disso, perigosa. Na história da humanidade, já vimos livros serem queimados, e sabemos exatamente no que deu. O ato hediondo protagonizado pelo casal de velhos nos remete à narrativa Fahrenheit 451, romance distópico de Ray Bradbury (1920-2012), lançado no ano de 1953, cujo cenário é um tempo futuro no qual não se admite que as pessoas tenham suas próprias opiniões as quais, para o Estado, são hedonistas e antissociais. Nada de “Defund Lukashenko”, por exemplo. Pensamento crítico? De jeito nenhum. Logo, nada de livros. Se encontrados, arderão no fogo.


A incivilidade do ato protagonizado pelo casal de idosos nos lembra George Steiner (1929-2020) quando na obra Aqueles que queimam livros (2017), traduzida por Pedro Fonseca e publicada no Brasil pela editora Âyiné, diz:

 

Aqueles que queimam livros, que banem e matam poetas, sabem exatamente o que fazem. Seu poder é incalculável. Precisamente porque o mesmo livro e a mesma página podem ter efeitos totalmente díspares sobre diferentes leitores. Podem exaltar ou aviltar; seduzir ou enojar; estimular à virtude ou à barbárie; acentuar a sensibilidade ou banaliza-la”, pois os livros, continua Steiner, “são a chave de acesso para nos tornarmos melhores. (STEINER, 2017.p.15)

 

Assim sendo, é preciso que a sociedade esteja atenta e forte, pois aqueles que queimam livros hoje são capazes de queimar gente amanhã.

domingo, 14 de junho de 2020

Cântico negro - José Régio



Cântico negro
José Régio


"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!




José Régio
pseudônimo literário de José Maria dos Reis Pereira, nasceu em Vila do Conde em 1901. Licenciado em Letras em Coimbra, ensinou durante mais de 30 anos no Liceu de Portalegre. Foi um dos fundadores da revista "Presença", e o seu principal animador. Romancista, dramaturgo, ensaísta e crítico, foi, no entanto, como poeta. que primeiramente se impôs e a mais larga audiência depois atingiu. Com o livro de estréia — "Poemas de Deus e do Diabo" (1925) — apresentou quase todo o elenco dos temas que viria a desenvolver nas obras posteriores: os conflitos entre Deus e o Homem, o espírito e a carne, o indivíduo e a sociedade, a consciência da frustração de todo o amor humano, o orgulhoso recurso à solidão, a problemática da sinceridade e do logro perante os outros e perante a si mesmos.

domingo, 7 de junho de 2020

Como o Brasil deu no que deu



No momento em que escrevo, o número de mortos por Covid-19 já passa dos 35 mil. A República mal se sustenta em pé e a democracia é atacada por pessoas de quase todos os lados, inclusive por aquelas que juraram defendê-la. À noite, dezenas de fascistas, munidos de tochas, num arremedo de Ku Klux Klan tupiniquim (aqui, criamos a figura do supremacista pardo), marcham em direção ao Supremo Tribunal Federal, numa tentativa torpe e criminosa de emparedar seus ministros. São mais de 35 mil mortos. O presidente da República, eleito democraticamente, anda a cavalo e saúda manifestações antidemocráticas. O racismo estrutural e a perversidade da elite brasileira empurraram um menino negro de cinco anos de idade do nono andar de um prédio de luxo para a morte. Depois de pagar R$ 20.000 pela morte que causou, a madame pôde voltar para casa e terminar de fazer as unhas. São mais de 35 mil mortes e, pressionados pela força do poder econômico, prefeitos e governadores autorizam a abertura daquilo que, na verdade, nunca esteve fechado, o mercado. Seguimos abrindo covas. O governo nega transparência aos dados que nos dizem o número de mortos. O Brasil segue à deriva. Golpistas e reacionários formam uma “frente ampla” para combater o fascismo que eles mesmos ajudaram a chegar ao poder, perseguindo e criminalizando líderes e partidos de esquerda. A ideia não é derrotar o fascismo de coturno, mas substituí-lo por um fascismo de sapatênis. O perfil do presidente no Twitter registra uma frase de Mussolini. Nada mais é feito às sombras. “Os idiotas perderam a modéstia”.

E muita gente se pergunta como chegamos até aqui, como o Brasil deu no que deu. As tentativas de resposta para tais questionamentos são muitas e intensas, que nem caberiam nesta pobre e limitada crônica. O que sabemos desde sempre é que a desconstrução desse país, de suas instituições, educação, cultura e saúde faz parte de um projeto de longo tempo, que tem por objetivo privilegiar a elite financeira (a classe média acha que faz parte desse projeto), mantendo a população pobre como eterna escravizada, sem acesso aos bens e serviços mais básicos, que é aquilo que se espera de nações verdadeiramente democráticas, por isso mesmo submetida aos ditames e perversidades da classe rica, branca e poderosa. Na contramão do que se vê no mundo, o vice-presidente brasileiro ousa afirmar que não há racismo no Brasil. Se em vez de gastar R$ 44.000 em uma esteira o senhor vice-presidente investisse o dinheiro público em livros e em bons canais de informação, não nos indignaria tanto. Mas como sabemos, isso não é preocupação da casa-grande.

A frase que dá título ao presente texto é parte de um título maior, de um ensaio do professor Darcy Ribeiro (1922-1997). O ensaio do referido antropólogo chama-se Aos trancos e barrancos: como o Brasil deu no que deu, de 1985. Assim como Darcy Ribeiro, inúmeros outros autores tentaram (e ainda tentam) explicar como o Brasil deu no que deu, explorando as perseguições políticas, os preconceitos, os genocídios, os golpes etc.

A seguir, listamos algumas obras que são, a nosso ver, indispensáveis para a compreensão de um Brasil que se transmuta, mas na sua essência muda muito pouco. A lista dessas obras, no entanto, não segue nenhum rigor metodológico ou cronológico. É apenas uma lista posta como sugestão de leitura, sem nenhuma outra preocupação.

  1. Os Sertões, de Euclides da Cunha
  2. Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre
  3. Os Donos do Poder – Formação do patronato político brasileiro, de Raymundo Faoro
  4. Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda
  5. Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Júnior
  6. Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado
  7. Formação da Literatura Brasileira, de Antonio Candido
  8. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira, de Paulo Prado
  9. Carnavais, Malandros e Herois: para uma sociologia do dilema brasileiro, de Roberto DaMatta
  10. O Povo Brasileiro, de Darcy Ribeiro
  11. Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro
  12. Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi, de José Murilo de Carvalho
  13. Dialética da Colonização, de Alfredo Bosi
  14. Devassos no paraíso- a homossexualidade no Brasil, da colônia à atualidade, de João Silvério dos Trevisan
  15. O negro no Brasil, de Júlio José Chiavenato
  16. O genocídio do negro no Brasil: processo de um racismo mascarado, de Abdias Nascimento
  17. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro (séculos XVIII e XIX), de Manolo Florentino
  18. Significado do protesto negro, de Florestan Fernandes.
  19. Pequeno manual antirracista, de Djamila Ribeiro.
  20. A Invenção do Nordeste e Outras Artes, de Durval Muniz de Albuquerque Júnior
  21. Brasil: uma biografia, de Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling
  22. A Elite do Atraso: da escravidão à Lava Jato, de Jessé Souza
  23. Subcidadania Brasileira: para entender o país além do jeitinho brasileiro, de Jessé Souza
  24. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal, de Milton Santos
  25. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI, de Milton Santos e Maria Laura Silveira
  26. Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire
  27. Made in Macaíba, de Miguel Nicolelis


               Boa leitura!



sábado, 30 de maio de 2020

Toda imagem é um espelho





Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente de Portugal


Os livros de Alberto Manguel são do tipo que costumam causar grande prazer ao leitor (assim deveriam ser todos os livros). Todos, sem exceção, são leves, agradáveis e carregados de uma variedade de conhecimento capaz de elevar o espírito daqueles que se dedicam a, pelo menos, folheá-los. Da obra do autor argentino, muito me agradam Uma História da leitura (1997) e Lendo imagens - Uma história de amor e ódio (2001). Lendo imagens é de uma beleza gritante, no que diz respeito às análises que são feitas a partir das obras de artistas como Tina Modotti, Aleijadinho, Picasso e Caravaggio, por exemplo. O trabalho consiste, basicamente, em analisar a obra de determinado/determinada artista, explorando certas temáticas. Por exemplo: "Marianna Gartner: a imagem como pesadelo" ou "Joan Mitchel: a imagem como ausência". E assim, sempre fazendo essa relação, o autor disponibiliza onze análises.

Costumeiramente, recorro a esse livro em busca de uma ou outra informação. Ás vezes, no entanto, o busco apenas como constatação de possuí-lo, e me vejo como a personagem de "Felicidade Clandestina", conto de Clarice Lispector. E, parafraseando a autora, finjo que não o tenho, só para ter o susto de o ter. Horas, dias, semanas depois abro-o, leio algumas páginas maravilhosas, fecho-o de novo, ando pela casa (geralmente de madrugada), adio a centésima leitura, mas sem ir comer pão com manteiga, e minto pra mim mesmo, fingindo que não sei onde o guardei. 

A imagem é uma forma de compreensão, de nós mesmos e dos outros.Todo retrato, nos diz Manguel, é, em certo sentido, um autorretrato que reflete o espectador. Como "o olho não se contenta em ver", atribuímos a um retrato as nossas percepções e as nossas experiências. Na alquimia do ato criativo, continua ele, todo retrato é um espelho.  E eis que lembro a primeira vez que vi uma Ferrari nas ruas da minha cidade. Na ocasião, fui tomado por um misto de admiração e indignação. Aquilo era para mim uma esfinge. E pensei que quem pode comprar uma Ferrari pode desfilar com ela por onde bem quiser, inclusive pelas ruas esburacadas e fedidas a merda da minha provinciana cidade. E assim, nunca esqueci daquela imagem na vida das minhas retinas tão jovens, mas já tão fatigadas. Eu, que naquela ocasião era apenas um rapazinho latino-americano, suportando o peso de tudo aquilo que é negado a um rapaz latino-americano sem parentes importantes. Assim, não compreendia que aquela Ferrari era a mais pura tradução do fosso que separa ricos e pobres em um país que se orgulha de ser excludente, ao mesmo tempo em que, esquizofrenicamente, fala em meritocracia. Entendi, então, que imagens também podem ser, ao mesmo, aterradoras e conscientizadoras.

Há, em todas as cidades do Brasil, lugares que são delimitados por linhas (nem sempre) imaginárias, que dizem aonde você, pobre, pode ou não pode ir, muito menos permanecer, sem que você possa ser considerado estar em “atitude suspeita”. Isso, obviamente, não é privilégio do Brasil, uma vez que até Bob Dylan já foi preso nos EUA por estar, acredite você, em atitude suspeita. Essa imagem é maravilhosa! Mas falamos daqui, abaixo da linha do Equador, onde quase tudo em relação aos menos favorecidos é sempre tão indecente e ofensivo quanto uma Ferrari cruzando ruas esburacadas e fedorentas.

Crescemos vendo na televisão como são belas as casas dos artistas e políticos brasileiros. Tem-se a impressão de que são seres humanos escolhidos e abençoados por um poder divino, cabendo a nós apenas admirar e agradecer por existirem. Dessa forma, seguimos acreditando que o fosso social que separa ricos e pobres é algo perfeitamente natural, e assim o é porque Deus o quis. Quantas vezes vimos nossos líderes políticos na fila de um supermercado ou andando de ônibus, como uma pessoa comum? Com exceção de um ou outro perdido, nunca os vemos. E por qual razão? A resposta é simples: para nossos líderes, tal distanciamento é necessário como imposição de respeito. Mas na verdade, a coisa não é bem assim. O que ocorre é que esses homens e mulheres políticos não se identificam como seres humanos comuns (houve por aqui um ditador que dizia preferir o cheiro dos cavalos ao do povo); acreditam que estão acima da maioria da população, ungidos por poderes superiores que os permitem, da sua torre de marfim, observar a massa amorfa de cidadãos de segunda classe. A reprodução dessa estupidez aliada à ignorância do povo (se tiver uma boa pitada de religião, perfeito) é a receita para que tudo continue como sempre esteve. E se pudéssemos vislumbrar uma imagem desse tipo de situação, seria a da imagem enquanto submissão, quando deveria ser, na realidade, a imagem enquanto revolta e subversão, como bem nos ensina Minneapolis ao cobrar justiça para George Floyd.

Tais considerações me vieram à mente, quando vi uma imagem que nos diz muito sobre o que somos enquanto sociedade e aquilo que podemos aprender com seres humanos, individualmente. Refiro-me, especificamente, à imagem do Presidente de Portugal, o professor Marcelo Rebelo de Souza, na fila de um supermercado, vestindo seu calção azul-celeste, usando máscara e respeitando o distanciamento exigido pelos protocolos da quarentena estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde. A imagem viralizou e surpreendeu o mundo inteiro, acostumado as inutilidades cotidianas da vida. Para Portugal, no entanto, foi algo corriqueiro. Diante da divulgação da referida imagem, soubemos que o professor, Presidente de Portugal, não mora no palácio presidencial, mas na casa na qual sempre viveu. Não se tem notícia de que o Presidente, professor Marcelo Rebelo de Sousa tenha ou dirija uma Ferrari. Uma das poucas certezas acerca do Presidente de Portugal é que ele, faça chuva ou faça sol, toma seu banho de mar todos os dias às 8h da manhã. Sem mais.

Portugal, como vemos, elegeu um professor como presidente, não um militar paraquedista. E isso faz muita diferença, pois toda imagem é um espelho.


Para ler a poesia de Alejandra Pizarnik







sábado, 23 de maio de 2020

A vida em lockdown




Já são mais de sessenta dias sem sair de casa. Agora há um lockdown, que pouca gente respeita. Muitos nem sabem o que se pretende com isso. Estamos praticamente no pico da pandemia e há gente fazendo carreata, churrasco e indo à praia. Já são, no momento em que escrevo, mais de vinte mil mortos no país. No momento em que escrevo, também temos um presidente completamente alheio ao caos que impera por aqui. Não temos ministro da saúde e os hospitais estão lotados.

Quando uma situação pela qual passamos surge, há muito pouco a se fazer, a não ser acreditar na Ciência e nos cientistas. No caso do Coronavírus, a forma mais eficaz de impedir a propagação é o isolamento. O ar está contaminado. O vírus não escolhe suas vítimas, embora os pobres, pretos e periféricos morram aos montes sem que lhe permitam o mínimo de dignidade. Há, no Brasil, um genocídio em progresso, com os mais vulneráveis entregues à própria sorte. Em meio à matança, tem muita gente lucrando com respiradores e EPIs, comprados sem licitação, ou seja, lucrando com a morte. Surpresa? Nenhuma. O Brasil, como vaticinou o poeta, não é para amadores.



Enquanto o mundo inteiro se une no combate à pandemia, o presidente brasileiro e mais três outros líderes, conforme noticiou o jornal britânico Financial Times, ficam à parte, isolados e alheios às decisões que visam impedir a disseminação do vírus. Além do presidente brasileiro, completam o grupo de negacionistas Daniel Ortega, da Nicarágua, Alexander Lukashenko, de Belarus e Gurbanguly Berdymukhamedov, do Turcomenistão. Por razões óbvias, esse grupo foi denominado pelo professor Oliver Stuenkel, da FGV, de “Aliança do Avestruz”. Melhor denominação, impossível.

Em meio a orientações e determinações de lockdown feitas pelos governadores, o governo federal faz cara de paisagem e, a olhos vistos, incentiva a desobediência às leis de isolamento. Como resultado de tamanha irresponsabilidade, a sanha da elite financeira força a abertura do comércio, enquanto canalhas travestidos de pastores abrem igrejas e vendem sementes milagrosas que “curam” da Covid-19. E o vírus se espalha.  Homens, mulheres e crianças ocupam os parques e shopping centers. Na calada da noite, dizem, há orgias. Sabe-se lá. E o vírus se espalha. No mais íntimo de nós, há o medo de que jamais possamos abraçar aqueles a quem amamos. Tal possibilidade nos adoece e nos fere de dor, pânico e quase  morte. É preciso, no entanto, nos mantermos unidos e fortes, apesar das perdas. A mente precisa estar sã. Caso contrário, sucumbiremos.

O desrespeito pela natureza, certamente contribuiu para estarmos onde estamos. Para o infectologista Oriol Mitjá: “a epidemia do Coronavírus era evitável”. E acrescenta, afirmando que é evitável 90% ou mais dos males que temos causado ao planeta, a nós mesmos e ao próximo. Até quando? Até onde iremos? Há a possibilidade de que saiamos mais solidários e mais prudentes dessa pandemia. Também é possível que não aprendamos absolutamente nada, e continuemos errando ad infinitum. Há gente na rua. Há bares com portas semicerradas, como se o vírus pudesse ser enganado. Há a estupidez humana. Há a desonra do ser humano, o descaso pela vida do próximo.

Em meio ao isolamento, leio a poesia de Nicanor Parra, escuto música e escrevo uma linha ou outra. Há barulho na rua. Alguém poda uma árvore. Sorrio com o sorriso da minha filha mais nova. Não posso abraçar a mais velha, que está distante. As chamadas de vídeo diminuem um pouco a saudade, mas não as tristezas.

Tentamos nos manter ocupados. Mas queríamos mesmo era estar livres e poder sair para ver o mar, esse enorme senhor das grandes batalhas. Aguardemos.

terça-feira, 19 de maio de 2020

Sobre belos e malditos




Os números continuam aumentando. Os jornais contam casos e cadáveres. As ruas começaram a ficar desertas. Profissionais da saúde correm contra o tempo. Muitos estão morrendo. Na solidão do isolamento releio “A borboleta e o tanque”, de Hemingway. A intolerância que conduz a narrativa angustia. Faz tempo perdemos nossa humanidade, penso. Sobre a pandemia, as piadas e os memes já começam a desaparecer. Triste, a alegria se recolhe. Por quanto tempo ficará reclusa? Sabe-se lá.

Hoje ouvimos música e vestimos nossa filha de bailarina. Ao entretê-la, lembrei daquele pai que, na Síria, em meio a bombardeios diários, ria de cada bomba  que caia, fazendo sua filha se divertir e esquecer o terror que ocorria (ainda ocorre) ali. Apenas lembro, pois qualquer tentativa de comparação seria impossível. Ambos, pai e filha , conseguiram sair do inferno e foram recebidos pela Turquia.




As bobagens que a Internet traz acabam por tornar nossos dias mais leves. Temos rido muito. E isso é muito bom, pois espanta os males e as dores, como quando cantamos. Por outro lado, a Internet também nos traz as piores notícias do mundo. Tais notícias adoecem nossos corações e nossas mentes. Porém, não há como ignorá-las. E assim, vamos lendo sobre aqueles que salvam vidas, bem como aqueles que  ajudam aos mais necessitados. A esses, chamo de belos. Do outro lado, há aqueles que não demonstram nenhuma empatia pelo próximo, querem, não importa como, abrir suas lojas e lucrar, lucrar e lucrar. São os malditos. Será que um dia esse país terá alguma decência? Ainda há rosas capazes de florescer no asfalto?

Como país, seguimos à deriva. Há doentes e mortos. Há polícia e tiroteio na favela, onde deveria haver médicos e dignidade. Um menino foi morto pela polícia, que sequestrou seu corpo. Em meio a tanto caos, a morte de uma criança dilacera o coração de qualquer pessoa que ainda não se permitiu bestializar-se. João Pedro era um menino negro, belo. João Pedro entrou para as estatísticas como mais um menino negro assassinado pela polícia (God damn it!) que é paga para servir e proteger. 

O Brasil está à deriva. Não há projetos que objetivem melhorias para a população. Há projetos pessoais de poder. Há o avanço do fascismo. Ao Coronavírus, isso pouco interessa. A morte bate à porta. Todo dia o Brasil é morto por um tiro de fuzil. E assim, seguimos abrindo covas e mais covas até que consigamos, um dia, abrir uma tão grande que caiba o Brasil e possamos, finalmente, descansar em paz.


domingo, 3 de maio de 2020

O que significa um nome?



Conhecemos pessoas com nomes comuns, diferentes, extraordinários. Muitos desses nomes podem não significar nada para uns. Para outros, no entanto, são nomes especiais. E o são por conterem em si uma carga significativa de memórias e afetos, que são acionados sempre que dizemos e/ou ouvimos tais nomes. Um nome, ao ser substituído por um número, desumaniza, pois apaga uma identidade, objetificando o nomeado. Os líderes totalitários sabem muito bem disso. E assim, sempre que a mão pesada da repressão cai sobre seus opositores, o primeiro ato é desumanizá-los, apagando-se o nome, a identidade.

Em Romeu e Julieta, peça escrita por William Shakespeare (1564 – 1616) entre 1591 e 1595, tem-se a história trágica do amor entre Romeu, filho de Montéquio, e Julieta, filha de Capuleto. Por serem filhos de famílias rivais, Romeu e Julieta não podem consolidar o amor que sentem um pelo outro. Neste caso, os nomes das famílias, que trazem em si um histórico de disputas, traições e tragédias, pesam sobre as decisões e o destino do jovem casal. No segundo ato, cena II, há uma das mais belas passagens sobre o peso que um nome impõe àqueles que o carregam. E assim, em diálogo com Romeu, Julieta pergunta: “o que significa um nome? Aquilo a que chamamos rosa, com qualquer outro nome teria o mesmo doce perfume. E Romeu também, mesmo que não se chamasse Romeu, ainda assim teria a mesma amada perfeição que lhe é própria (...)”. O trecho citado consta da tradução de Beatriz Viegas-Faria, para a reimpressão de Romeu e Julieta, da Coleção L&PM POCKET, de 2010.

O “caso” Romeu e Julieta é específico e pertence a um contexto não menos específico, ou seja, tem-se o contexto da rivalidade entre famílias. Na vida real, no entanto, as coisas não funcionam bem assim, tendo em vista a carga semântica que cada nome possui. As memórias que acesso quando falo ou escuto os nomes Clarice, Geórgia e Tarsila pertencem ao meu universo particular, às minhas histórias e memórias de vida, as quais me são extremamente importantes. Substituir esses nomes por outros implicaria no apagamento de tudo aquilo que me constitui como um ser humano intimamente ligado a cada um deles. Em síntese, estaria apagando parte da minha identidade.


Penso no que significa um nome, quando leio nos jornais que na próxima semana teremos, conforme o Ministro da Saúde, por volta de mil mortos por dia, o que daria, considerando-se as subnotificações, aproximadamente dez mil mortos já na primeira semana de maio, vítimas da pandemia do Coronavírus. Esses dez mil mortos não terão direito a um nome na lápide. Terão apenas um ou outro membro da família a dar-lhes o último adeus. Umas flores talvez. Serão enterrados em caixões lacrados, junto a outros corpos, em uma vala coletiva. Serão não mais que números para o Estado. E números, o que são? Mas continuarão sendo nomes para aqueles com quem conviveram e amaram.

Os tempos são difíceis. Não há luz no horizonte. Mas é preciso continuar em frente. Sobre isso, Antígona, personagem de mesmo nome na peça de Sófocles (496 a.C – 406 a.C) pode nos servir de farol. Na apresentação da reimpressão de Antígona para  a Coleção L&PM POCKET, de 2010, Donaldo Schüler, o tradutor, nos diz:

Antígona é uma peça de fortes contrastes. Onde convocar forças para derrubar o tirano quando cidadãos respeitáveis calam? Sófocles coloca uma mulher sem partidários, sem exército, sem nada. Antígona abala a tirania sozinha. E isso  numa sociedade em que a vida pública era de exclusiva competência masculina. O homem é terrível (deinós), dirá o coro. Preserve-se a ambiguidade. O homem é terrível no crime e na virtude, em altos pensamentos e atitudes intempestivas, na opressão e na luta pela liberdade. Antígona morre? Morre! Morre como poucos. Morre para dignificar todos os que  em todas as épocas atacam a injustiça. Não há tormento  maior do que viver como Creonte, o tirano – entre ruínas espalhadas pelos seus desatinos. Antígona é uma aventura de lealdade, dignidade, linguagem e vida. (SCHÜLER, 2010:5)


É tempo de desafiar o tirano Creonte e seguir o exemplo de Antígona. 

Que não nos demoremos!


sexta-feira, 1 de maio de 2020

O Brasil entre o “e daí?” e o “foda-se”



Em 24h, o Brasil registrou 474 mortes em decorrência do Covid-19. Foram 20 mortes por hora, o que dá uma morte a cada três minutos. A quantidade de mortos, sem se levar em consideração as subnotificações, já superou as mortes ocorridas na China, e não param de crescer. Hospitais e cemitérios estão lotados, famílias estão desesperadas. São homens, mulheres e crianças contaminados, relegados a um canto qualquer de alguma unidade de atendimento médico. Os profissionais da saúde, por sua vez, não estão menos desesperados, pois estão trabalhando além daquilo que podem suportar, sem poder nem ao menos abraçar seus entes queridos. O isolamento social, indispensável para se conter o avanço do vírus, tem afetado a saúde mental de muitos. E o que dizer daquelas famílias que nem sequer podem dar um funeral decente aos seus mortos?

Sim, há um misto de desespero, tristeza e angústia a atacar a população brasileira. O momento, no entanto, não permite a ninguém tripudiar sobre aqueles que votaram no atual mandatário da República e que, infelizmente, estão infectados ou morreram. Esse tipo de atitude serve apenas para nos reduzir enquanto seres humanos, pois, independentemente da situação, a desumanização jamais deve se tornar uma opção, mesmo em tempos de cólera.



Há, no país, um caos generalizado. Tem-se a sensação, comprovada pelas notícias confiáveis que nos chegam, de que pouco ou quase nada tem sido efetivamente feito pelo governo federal para barrar o avanço da contaminação. Enquanto a maioria dos governadores tenta salvar a população dos Estados que comandam, o país é inundado todos os dias por milhares de notícias falsas, muitas delas divulgadas por membros do próprio governo federal, que tentam desconstruir a importância da população se proteger, mantendo-se socialmente isolada. É bastante curioso, por exemplo, que pessoas com nível ralo de educação, como certos parlamentares, por exemplo, insistam em tentar desacreditar cientistas que passaram suas vidas estudando epidemias.  Qual a resposta que a justiça brasileira tem dado a esse tipo de crime? nenhuma. E assim seguimos à deriva, vendo a cada novo dia, covas e covas serem abertas, corpos serem empilhados e a morte a bater-nos à porta.

O país vive, ao mesmo tempo, uma crise política, uma econômica e uma sanitária. Tais crises que, de uma forma ou outra, estão interligadas, não poderiam ter explodido em pior momento. Momento este em que o Brasil carece de uma liderança política que o conduza em meio a tormenta. Mas já faz muito tempo que o Brasil não dispõe de grandes lideranças (se é que algum dia as teve), uma vez que se acostumou à mediocridade do toma-lá-dá-cá, modus operandi eternamente em voga por aqui. Assim, aos mais altos poderes da República são alçados os piores nomes. São filhos e netos de velhas raposas da política nacional, que jamais fizeram algo na vida, a não ser mamar nas tetas do Estado. São vereadores, deputados, governadores e senadores que deixam muito a desejar àquilo que as funções que ocupam exigem. São ignorantes, autoritários e culturalmente despreparados para o desempenho das funções que a Política requer.

Quando surge uma situação emergencial, como a que nos assola, que exige ação e expertise de gestão, a experiência limítrofe de gabinete da maioria desses políticos, não serve para absolutamente nada, assim como também não serve para nada ter chegado a alguma das esferas do poder, simplesmente por ter entupido a Internet de robôs, espalhando as mais imbecis das fake news, aproveitando-se da ignorância de grande parte da população. Em uma situação de crise sanitária, como a que estamos enfrentando, não adianta um político com as características citadas vir a público e dizer que votou no candidato tal, mesmo sabendo que ele era “um jumento”. É ridículo, pois, pelo que me consta, jumento não vota em tigre.

Questionado acerca do crescente número de mortos em decorrência do Coronavírus, o excelentíssimo senhor presidente da república respondeu: “e daí?”. Em qualquer país sério, o referido senhor já teria sido apeado do poder, processado e, provavelmente, preso. Contudo, no Brasil, república de bananas (e bananinhas), na qual os líderes políticos, aliados ao capital, faça chuva, faça sol ou pandemia, trabalham, muitas vezes na calada da noite, contra a população. A herança maldita do escravismo continua cada vez mais forte por aqui. Assim, não nos surpreendamos se ao senhor presidente for perguntado mais uma vez sobre o crescente número de mortos em decorrência do Covid-19 (e em decorrência do descaso do seu governo). A resposta poderá ser um “foda-se”.

terça-feira, 28 de abril de 2020

Quem não respeita seus mortos, não respeita nada



Por Rosa Montero

Sempre fui fascinada pelos vários ritos funerários que o ser humano criou ao longo da história. A morte é algo tão grande e tão incontrolável, sobretudo para nós que ficamos aqui e temos que lidar com o inaudito desaparecimento de um ente querido, que somos forçados a buscar truques defensivos. E, como a morte não se deixa domesticar por meio de palavras (a verdadeira dor nos emudece), recorremos às cerimônias coletivas para encontrar consolo.

Barcos flamejantes que adentram o mar para os vikings, pirâmides e mumificações para os egípcios, cremações sagradas para os budistas, cemitérios tão monumentais que acabam sendo verdadeiras cidades da morte. E, então, as manias peculiares de cada cultura: os muçulmanos devem ser enterrados sem caixão, de lado e olhando para Meca; Os aborígines da Austrália colocam o corpo em uma plataforma, cobrem-no com folhas e o deixam apodrecer ao ar livre; no vilarejo de Sagada, nas Filipinas, os caixões são pendurados nos penhascos, porque assim ficam bem perto do céu (que lindo); e os pársis de Mumbai usam as impressionantes Torres do Silêncio, construções de pedra onde os cadáveres são depositados para que os urubus os devorem, o que, pensando bem, possui uma beleza selvagem e ecológica.


Sim, temos que fazer algo com a morte, temos que aprisioná-la com ritos precisamente para salvar a vida. É por isso que desde sempre uma das medidas mais claras da devastação causada por uma catástrofe é o fato de nos roubar essa liturgia final. Acontece nas guerras, com os mortos desaparecidos em combate; acontece nas explosões que evaporam corpos, como os acidentes de avião ou as das Torres Gêmeas. E acontece nas pandemias. Quando os cronistas das várias pestes sofridas pela humanidade queriam destacar o horror supremo do que estavam vivendo, falavam disso: dos milhares de mortos sem enterrar porque "aqueles que cavavam já não davam conta", como dizia Procópio de Cesareia na peste de 541; ou o que escreveu durante a Grande Peste de 1348 Agnolo di Tura, um morador de Siena, onde metade da população havia morrido: “Enterrei com minhas próprias mãos cinco filhos em uma única sepultura. Não houve sinos. Nem lágrimas. Isto é o fim do mundo”. Não, não houve sinos, não houve ritual, não houve uma despedida apropriada e, portanto, não houve salvação.

E isto é o mais duro, o mais devastador que está acontecendo agora com o coronavírus. Todas essas mortes, todas elas sem o consolo do velório e muitas, além disso, sem a mera possibilidade de lhes terem dito adeus. E todos esses parentes trancados na solidão de suas casas, necessitados de lágrimas amigas para molhar seus ombros e contemplando como seus mortos se convertem em um simples número no meio de uma lista. Temos que fazer algo com essa dor enorme. E isso tem que ser feito já. Quando a situação melhorar, assim que pudermos nos permitir, é preciso organizar funerais de Estado e cerimônias coletivas como os três minutos de silêncio que fizeram na China. Mas, enquanto esse momento não chega, podemos honrar os mortos de alguma maneira, fazer pequenos gestos. Pois, então, por que não colocar, por exemplo, um pequeno laço preto em nossas sacadas? Seria solidário compartilhar a dor de nossos vizinhos. E também, é claro, a esperança. Quando este artigo sair, 15 dias depois de escrevê-lo, pode ser que haja alguma iniciativa desse tipo.

Já dizia a Ilíada, esse livro de quase 3.000 anos que hoje continua a nos falar com eloquência. Quando Aquiles, envenenado pela raiva, mata em combate o nobre príncipe Héctor, comete assim a maior e mais inconcebível das iniquidades: amarra o cadáver pelos tornozelos a seu carro de guerra e a arrasta e o mantém à intempérie durante 12 dias. Uma noite, o velho rei Príamo, disfarçado, tem que ir ao seu acampamento e suplicar de joelhos ao feroz Aquiles para que lhe devolva o cadáver do filho (o que ele consegue, aliás). A Ilíada é cheia de brutalidades e degolas, mas a profanação do cadáver de Héctor é a mais atroz, é o clímax do livro. Porque quem não respeita seus mortos, não respeita nada. Nem sequer a si mesmo.

domingo, 19 de abril de 2020

Como sairemos da pandemia? Piores.


Em meio à pandemia de Covid-19, a humanidade se vê cada vez mais isolada. Estamos afastados daqueles e daquelas a quem amamos, e não sabemos muito bem quando nem como tudo isso acabará. O que já pode ser vislumbrado é que ao final de tudo isso, muitos estarão bastante traumatizados, uma vez que muita gente não consegue lidar com a obrigação do isolamento, desenvolvendo, assim, condições que precisarão ser tratadas por profissionais. A humanidade sairá mentalmente quebrada. E como “consertar” uma humanidade mentalmente quebrada?

Ao lermos os jornais, notamos que uma pergunta se faz recorrente: “Ao término da pandemia, sairemos pessoas melhores ou piores?” Um resposta para essa pergunta precisa levar em consideração inúmeros fatores de ordem política, histórica e sociocultural. Por exemplo, os ricos que estão fazendo as carreatas da morte por todo o país, interrompendo o trânsito em frente aos hospitais, pressionando os governos estaduais a abrir o comércio, buscando convencer seu funcionário a voltar ao trabalho, se infectar e morrer para o bem da empresa que o oprime desde sempre, sairão bem, como sempre se saíram ao longo da história desse país. Para esses senhores, seus empregados são apenas números. Não são gente. Que morram! Poderíamos pensar que eles sairiam mentalmente abalados, mas isso certamente não acontecerá. São predatórios. A fera caçadora não se preocupa com a caça. Assim, essas pessoas, enroladas na bandeira brasileira, travando as avenidas do país com seus carros luxuosos, não sairão nem melhores nem piores. Sairão do jeito que sempre foram, ou seja, mesquinhos, medíocres e felizes na sua estupidez.
As pessoas pobres, por sua vez, sairão alquebradas, física e mentalmente extenuadas, pois terão perdido entes queridos, amigos, vizinhos, amores. Tudo que tinham poderá ter sido posto num saco preto e jogado numa vala coletiva de um cemitério qualquer. Quem se importará? Os políticos que agora defendem a flexibilização do isolamento ( “pobre bom é pobre morto”),  os ricaços da lista da Forbes ou a grande mídia, que contribuiu para que o esgoto ascendesse ao poder máximo da República? Ninguém desse grupo, na verdade, se importará com a tragédia que está por vir, com o genocídio que se avizinha. Os “cidadãos de segunda classe” estão entregues à própria sorte num país à deriva.

Em meio a tudo isso, contamos com o silêncio conivente das Instituições que sempre foram extremamente ágeis quando aqueles que ocupavam o Executivo eram outros, os outros. Estariam tais Instituições funcionando? E se estão, em favor de quem? Cabe-nos perguntar, por onde andam os ministros “iluministas” do STF, a Câmara, o Senado, as associações e organizações que foram tão ativas ao se posicionarem em favor da deposição da presidenta Dilma Rousseff, por exemplo. Esse silêncio sepulcral se ampliará à medida em que se abrem centenas de covas nos cemitérios do país. Os cadáveres pesarão nas costas de todos que se omitiram e foram coniventes com o projeto de instalação da barbárie no Brasil. Os resultados já estão aí, e penso: como será difícil esconder tanto cadáver!

Em algum momento a pandemia passará, uma cura terá sido encontrada, e a sorrir, parafraseando Cartola, pretenderemos levar a vida. Contudo, não acreditamos que a humanidade saia melhor de tudo isso. Aqueles que oprimem, retornarão com mais vontade de oprimir, enquanto a política continuará a bradar e defender  que a economia é muito mais importante que a vida (dos pobres, claro). O ser humano sairá muito pior da pandemia, não por ser uma criatura naturalmente má, mas por ser, conforme o escritor José de Alencar, “um sistema de contrariedades”, e não conseguir aprender com aquilo que lhe acontece. Peguemos qualquer momento da história da humanidade (as Guerras Mundiais, o Holocausto, a escravidão etc) e veremos que pouco ou quase nada se aprendeu. Reconhecemos, no entanto, que nada é absoluto e que nenhum manual ou receita pode dizer de maneira assertiva do que o ser humano é capaz, embora seja previsível. 

Do isolamento, façamos nossas apostas.


sábado, 28 de março de 2020

Ariano Suassuna - A Moça Caetana - A Morte Sertaneja



Ariano Suassuna
A Moça Caetana - A Morte Sertaneja (com tema de Deborah Brennand)
Eu vi a Morte, a moça Caetana,
com o Manto negro, rubro e amarelo.
Vi o inocente olhar, puro e perverso,
e os dentes de Coral da desumana.

Eu vi o Estrago, o bote, o ardor cruel,
os peitos fascinantes e esquisitos.
Na mão direita, a Cobra cascavel,
e na esquerda a Coral, rubi maldito.

Na fronte, uma coroa e o Gavião.
Nas espáduas, as Asas deslumbrantes
que, rufiando nas pedras do Sertão,

pairavam sobre Urtigas causticantes,
caules de prata, espinhos estrelados
e os cachos do meu Sangue iluminado.

Ballad Of The Skeletons (Balada dos Esqueletos), de Allen Ginsberg



Said the Presidential Skeleton
I won't sign the bill
Said the Speaker skeleton
Yes you will

Said the Representative Skeleton
I object
Said the Supreme Court skeleton
Whaddya expect

Said the Miltary skeleton
Buy Star Bombs
Said the Upperclass Skeleton
Starve unmarried moms

Said the Yahoo Skeleton
Stop dirty art
Said the Right Wing skeleton
Forget about yr heart

Said the Gnostic Skeleton
The Human Form's divine
Said the Moral Majority skeleton
No it's not it's mine

Said the Buddha Skeleton
Compassion is wealth
Said the Corporate skeleton
It's bad for your health

Said the Old Christ skeleton
Care for the Poor
Said the Son of God skeleton
AIDS needs cure

Said the Homophobe skeleton
Gay folk suck
Said the Heritage Policy skeleton
Blacks're outa luck

Said the Macho skeleton
Women in their place
Said the Fundamentalist skeleton
Increase human race

Said the Right-to-Life skeleton
Foetus has a soul
Said Pro Choice skeleton
Shove it up your hole

Said the Downsized skeleton
Robots got my job
Said the Tough-on-Crime skeleton
Tear gas the mob

Said the Governor skeleton
Cut school lunch
Said the Mayor skeleton
Eat the budget crunch

Said the Neo Conservative skeleton
Homeless off the street!
Said the Free Market skeleton
Use 'em up for meat

Said the Think Tank skeleton
Free Market's the way
Said the Saving & Loan skeleton
Make the State pay

Said the Chrysler skeleton
Pay for you & me
Said the Nuke Power skeleton
& me & me & me

Said the Ecologic skeleton
Keep Skies blue
Said the Multinational skeleton
What's it worth to you?

Said the NAFTA skeleton
Get rich, Free Trade
Said the Maquiladora skeleton
Sweat shops, low paid

Said the rich GATT skeleton
One world, high tech
Said the Underclass skeleton
Get it in the neck

Said the World Bank skeleton
Cut down your trees
Said the I.M.F. skeleton
Buy American cheese

Said the Underdeveloped skeleton
We want rice
Said Developed Nations' skeleton
Sell your bones for dice

Said the Ayatollah skeleton
Die writer die
Said Joe Stalin's skeleton
That's no lie

Said the Middle Kingdom skeleton
We swallowed Tibet
Said the Dalai Lama skeleton
Indigestion's whatcha get

Said the World Chorus skeleton
That's their fate
Said the U.S.A. skeleton
Gotta save Kuwait

Said the Petrochemical skeleton
Roar Bombers roar!
Said the Psychedelic skeleton
Smoke a dinosaur

Said Nancy's skeleton
Just say No
Said the Rasta skeleton
Blow Nancy Blow!!!

Said Demagogue skeleton
Don't smoke Pot
Said Alcoholic skeleton
Let your liver rot

Said the Junkie skeleton
Can't we get a fix?
Said the Big Brother skeleton
Jail the dirty pricks

Said the Mirror skeleton
Hey good looking
Said the Electric Chair skeleton
Hey what's cooking?

Said the Talkshow skeleton
Fuck you in the face
Said the Family Values skeleton
My family value's mace

Said the NY Times skeleton
That's not fit to print
Said the CIA skeleton
Cantcha take a hint?

Said the Network skeleton
Believe my lies
Said the Advertising skeleton
Don't get wise

Said the Media skeleton
Believe you me
Said the Couch-potato skeleton
What me worry?

Said the TV skeleton
Eat sound bites
Said the Newscast skeleton
That's all Goodnight

Disse o Esqueleto Presidencial
Eu não assinarei o projeto de lei
Disse o Esqueleto Palestrante
Sim, você irá

Disse o Esqueleto Representante
Eu protesto
Disse o Esqueleto da Suprema Corte
O que você esperava?

Disse o Esqueleto Militar
Compre Bombas
Disse o Esqueleto de classe alta
Deixem as mães solteiras famintas

Disse o Esqueleto Yahoo
Parem a arte obscena
Disse o Esqueleto da Asa Direita
Esqueça do seu coração

Disse o Esqueleto Agnóstico
O humano forma o divino
Disse o Esqueleto da Moral Majoritária
Não, não é meu

Disse o Esqueleto Budista
Compaixão é riqueza
Disse o Esqueleto Corporativo
É mal para a sua saúde

Disse o o Velho Esqueleto Cristão
Olhem pelos pobres
Disse o Esqueleto Filho de Deus
AIDS precisa de cura

Disse o Esqueleto Homofóbico
As pessoas gays são uma droga
Disse o Esqueleto da Polícia Patrimonial
Negros são sem sorte

Disse o Esqueleto Machista
Mulheres em seus lugares!
Disse o Esqueleto Fundamentalista
Aumentem a raça Humana

Disse o Esqueleto a favor da vida
Fetos tem alma
Disse o Esqueleto de pró escolha
Enfie no seu cu

Disse o Esqueleto rebaixado
Robôs tomaram meu emprego
Disse o Esqueleto de dureza contra o crime
Gás lacrimogêneo na multidão

Disse o Esqueleto governador
Cortem o lanche das escolas
Disse o Esqueleto Prefeito
Comam a crise de orçamento

Disse o Esqueleto Neo Conservador
Sem teto fora das ruas!
Disse o Esqueleto de Mercado Aberto
Usem eles para carne

Disse o Esqueleto reflexivo
Livre Mercado é o caminho
Disse o Esqueleto de Poupança e Empréstimo
Façam o estado pagar

Disse o Esqueleto Chrysler
Pague pra você e para mim
Disse o Esqueleto de poder nuclear
E eu e eu e eu

Disse o Esqueleto ecológico
Mantenham o céu azul
Disse o Esqueleto de Multinacional
O que vale a pena para você?

Disse o Esqueleto da NAFTA
Fiquem rico, Livre Comércio
Disse o Esqueleto maquiladora
Doces compras, preços baixos

Disse o rico Esqueleto da GATT
Um mundo, alta tecnologia
Disse o Esqueleto subclasse
Pegue pelo pescoço!

Disse o Esqueleto do Banco Mundial
Cortem suas árvores
Disse o Esqueleto do FMI
Comprem queijo americano

Disse o Esqueleto Subdesenvolvido
Nós queremos Arroz!
Disse o Esqueleto das nações desenvolvidas
Vendam seus ossos por dados

Disse o Esqueleto Aiatolá
Morra escritor, morra
Disse o Esqueleto Joe Stalin
Isso não é mentira

Disse o Esqueleto do Reino Médio
Nós engolimos o Tibet
Disse o Esqueleto Dalai Lama
Indigestão é o que você vai obter

Disse o Esqueleto do Coral Mundial
Esse é o destino deles
Disse o Esqueleto E.U.A
Temos que salvar o Kuwait

Disse o Esqueleto da Petroquímica
Rujam bombas, rujam!
Disse o Esqueleto Psicodelico
Fume um dinossauro

Disse o Esqueleto
Apenas diga não
Disse o Esqueleto rastafári
Sopre Nancy, sopre

Disse o Esqueleto Demagógico
Não fume maconha
Disse o Esqueleto Alcoólico
Deixe seu fígado apodrecer

Disse o Esqueleto Nóia
Não podemos obter um barato?
Disse o Esqueleto Grande Irmão
Prenda os idiotas sujos

Disse o Esqueleto Espelho
Hey, bonitão
Disse o Esqueleto da cadeira elétrica
Hey, o que está cozinhando?

Disse o Esqueleto do talkshow
Fodo-te na tua cara
Disse o Esqueleto dos bons modos familiar
Os valores da minha família são um porrete

Disse o Esqueleto N.Y. times
Isso não se encaixa para impressão
Disse o Esqueleto da C.I.A
Não pode dar uma pista?

Disse o Esqueleto da internet
Acredite nas minhas mentiras
Disse o Esqueleto publicitário
Não fiquem sábios!

Disse o Esqueleto da mídia
Acredite em mim
Disse o Esqueleto sedentário
Por que me preocupar?

Disse o Esqueleto da TV
Coma frases de efeito
Disse o Esqueleto do noticiário
Isso é tudo, boa noite