
Gelo seco. Luzes. A “entidade”
Ricardo Guilherme está no palco. Daí por diante esquecemos o restante e nos
focamos no “homem-cena”, ali, para encenar De
olhos abertos lhe direi, solo estruturado a partir da obra poética do
compositor cearense Antonio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, ou,
apenas Belchior. O monólogo de Ricardo Guilherme faz parte de uma série de
homenagens pelos setenta anos do autor de “Alucinação”, e está inserido no projeto
Belchior sete zero, idealizado por Ricardo Kelmer. Constam ainda das
homenagens, rodas de conversas sobre o autor e sua obra, bem como o lançamento
do livro Para Belchior com amor (2016), organizado pelo próprio Kelmer, com a
participação de vários autores, os quais escreveram seus textos a partir de
canções do poeta sobralense.
A entrevista continua por
toda a peça, a qual dura por volta de cinquenta minutos. No decorrer da
encenação, Guilherme interage com as respostas dadas pelo entrevistado e
amplia, questiona, reflete e improvisa em cima daquilo que estamos ouvindo;
fazendo com que as vozes (por que não dizer os discursos) de ambos se coadunem
e se complementem simbionticamente, tornando-se a mesma voz a discorrer sobre
esse desespero que tem sido moda/foda de 1976 até 2016.
Os recursos são limitados: um microfone, uma
mochila, um par de óculos escuros, uma jaqueta jeans e três camisetas. Pode
parecer pouco, quase nada. E é muito pouco, quase nada. Devemos compreender, no
entanto, a proposta “andarilha” do projeto, o qual tem sido levado não apenas
para diversos pontos da cidade de Fortaleza, bem como para cidades no interior
do Ceará e, como sabemos, sempre costuma faltar apoio para a cultura. Logo, é
esse “menos”, que Ricardo Guilherme transforma em “mais”, a partir da sua verve
de ator competentemente grande e radical.
De
olhos abertos lhe direi é, assim, uma oportunidade imperdível de
ver o “monstro” Ricardo Guilherme no palco, assim como se deliciar com as
canções de um dos nossos poetas maiores, quando se comemoram seus setenta anos “de
sonho e de sangue e de América do Sul” e de sua imensurável contribuição
poética à cultura brasileira. O solo de Ricardo Guilherme está andando por aí,
mas este blog não tem como afirmar até quando ficará em cartaz. Assim, a quem
interessar possa, é bom correr e achar um cantinho para vê-lo. E mesmo que o
espaço não seja dos melhores, a atuação vale cada minuto.
Em tempo: Re(volta),
Belchior!
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Entrevista completa na qual Belchior fala de sua obra na Rádio Universitária em 1982
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