Fortaleza
é daquelas cidades que possuem a capacidade de inspirar. A brisa que sopra do
mar encanta a todos aqueles que habitam a cidade dos mares bravios, cantados em
prosa poética, por José de Alencar. Mas Fortaleza está esquecendo-se das
coisas. Seu casario histórico, por exemplo, está desaparecendo e, a continuar
assim, o fortalezense corre o risco de acordar em um belo dia de sol, cercado
por igrejas, bares e estacionamentos. Não que tenhamos nada contra os bares,
mas nem só de igrejas e estacionamento vive uma cidade.
E em meio à eterna mesmice recorrente nos
jornais locais, uma notícia chamou a atenção da cidade. Trata-se da divulgação
de que, oficialmente, o centenário prédio do Colégio Marista Cearense torna-se
bem cultural do Estado do Ceará, figurando no livro de tombo histórico e
etnográfico. Tendo suas atividades iniciadas por volta de 1913, a referida
edificação está localizada bem no coração da cidade, na Avenida Duque de
Caxias, 101, tendo abrigado por 90 anos o Colégio Cearense do Sagrado Coração.
Assim sendo, o prédio do histórico Colégio Cearense está tombado tanto pela
Prefeitura de Fortaleza quanto pelo Estado do Ceará; o que enche de orgulho,
alegria e satisfação todos aqueles que tiveram a sorte de caminhar por seus
pátios e corredores, como membros da grande família Marista.
Sobre
o Colégio Cearense, segue a crônica intitulada “Marista Cearense”.*
Vinda de uma outra escola, a
menininha perguntou ao então diretor do Colégio Marista Cearense o motivo pelo
qual não se elegia a rainha do Colégio Cearense. Com paciência de santo, o
diretor respondeu que não era necessário, pois todas as alunas da escola eram
rainhas do Colégio Cearense. Não sei se, de início, a garota aceitou muito bem,
mas depois, com certeza.
Ver o diretor catando papel na hora do recreio ou até mesmo “batendo uma bolinha” com os alunos era coisa mais que comum naquela escola: a pedagogia da presença, sabíamos.
Na maioria das escolas, meninos e meninas não vêem a hora de ir pra casa. Não lá. Ao contrário, “precisavam ser mandados embora”, pois, se dependesse deles, não arredariam pé. Aqueles que estudavam à tarde chegavam cedo, quase pela manhã. Os que estudavam pela manhã entravam pela tarde. Chegava a noite, e meninos e meninas ainda preenchiam de alegria as quadras e pátios do Colégio Cearense.
Para quem não teve a chance de estudar ou trabalhar lá, é difícil compreender exatamente o que era tudo aquilo. No coração de Fortaleza (como imaginar uma cidade sem coração?), “por Deus, pela Pátria e por Maria...”, o Cearense formou muita gente boa. Dizem que muita gente que é importante (todo mundo é importante!) e famosa passou por lá. E por formar gente boa, o Cearense pagou um preço muito alto.
O mais importante mesmo é que o Colégio Cearense fecha, mas não acaba. Ele
estará sempre nos corações e nas atitudes de cada homem e de cada mulher, que,
quando menino, menina, jovem, ocupou seus bancos, suas quadras, seus pátios...
Seu ventre.
*A crônica “Marista Cearense” está no livro de crônicas Memória de
peixe, de Carlos Carvalho, vencedor do Prêmio de Literatura Unifor, de
2009.
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