No dia 27 de março de 2018, é a
votação do Plano Municipal de Educação, na Câmara Municipal do Rio de
Janeiro. O plano estabelecerá as
diretrizes da educação e suas prioridades no Rio nos próximos 10 anos.
O discurso de Marielle já
estava sendo feito antes de ser assassinada e a equipe do mandato Marielle
Franco disponibilizou o texto. O
companheiro Tarcísio Motta irá lê-lo no Plenário, durante a votação.
No Brasil inteiro, a educação
vem sofrendo um boicote por uma ideologia da intolerância e do desrespeito,
principalmente em relação à igualdade de gênero. Não está sendo diferente aqui no Rio. Estão tentando retirar a
palavra "gênero" do Plano para que não haja o debate nas escolas
sobre igualdade entre homens e mulheres, meninas e meninos.
Confira o discurso que Marielle
iria fazer.
"Boa tarde à todas e todos,
O Brasil é o quinto país que mais mata mulheres no mundo.
Os números são assustadores: em 2016, foi registrada uma violência
contra mulher a cada 5 horas no Estado do Rio de Janeiro.
Mas também sabemos que estes números são apenas de parte das mulheres
que conseguiram, de algum modo, buscar auxílio e denunciar.
E eu pergunto à vocês: seguiremos nos recusando a falar sobre igualdade
de gênero? Até quando?
O debate sobre a nossa igualdade é urgente no mundo, no Brasil e no
município do Rio de Janeiro!
Enfrentar este debate é nos comprometermos com a democracia e com nosso
avanço civilizatório.
Falar de igualdade entre mulheres e homens, meninas e meninos, é falar
pela vida daquelas que não puderam ainda se defender da violência. E são muito
mais das 50.377 registradas em 2016, aqui, no Rio.
Diferente do que se fala ou, infelizmente, do que se acostuma ver em
Casas Legislativas, como esta, não somos a minoria. Somos a maior parte da
população, ainda que sejamos pouco representadas na política.
Ainda que ganhemos salários menores, que estejamos em cargos mais
baixos, que passemos por jornadas triplas, que sejamos subjulgadas pelas nossas
roupas, violentadas sexualmente, fisicamente e psicologicamente, mortas
diariamente pelos nossos companheiros, nós não vamos nos calar: as nossas vidas
importam!
No Brasil, segundo o IPEA (2016). As mulheres negras brasileiras ainda
não conseguiram alcançar nem 40% do rendimento total recebido por homens
brancos. E somos nós, mulheres negras, que mais sofremos violências
diariamente.
Só quem acha que isso é normal é quem não sofreu no corpo o machismo e
o racismo estrutural. Quem acha que isso não merece ser debatido na nossa
educação é porque se benefecia das desigualdades.
Por isso, quero deixar registrado que essa Casa, ao retirar os termos
“gênero”, “sexualidade” e “geração”, fortalece a continuidade de desigualdades
e violências dos mais diversos tipos.
Hoje falamos do principal plano para desenvolvimento social do nosso
município: o Plano Municipal de Educação. Este plano merece que tenhamos
compromisso e responsabilidade.
O termo “gênero” começou a ser utilizado como categoria de análise a
partir de 1970 com o objetivo de dar visibilidade às desigualdades entre homens
e mulheres. Logo, tanto na origem da sua criação, quanto no uso corrente em
debates sobre a superação das desigualdades, falar de “gênero” tem como
finalidade promover a devida atenção e crítica das discriminações sofridas
pelas mulheres, e tentar achar meios para que todas e todos possamos juntos
enfrentar este cenário.
Desde quando falar sobre uma opressão, que gera tantas mortes, é falar
sobre alguma doutrinação?
Se dizem tanto a favor da vida, então deveriam ser a favor da igualdade
de gênero. E só se promove igualdade através de uma educação consciente e do
debate com nossas crianças, para que se tornem adultos melhores.
Por isso, como parlamentares responsáveis pelas cidadãs e cidadãos
dessa cidade, devemos defender o debate na educação!
Se é da escola que nasce o espaço público que queremos, é indispensável que se fale de igualdade de gênero sim! Que se fale de sexualidade, de respeito, de laicidade, de racismo, de LGBTfobia, de machismo. Pois falar sobre estes temas é se comprometer com a vida, em suas múltiplas manifestações. É se comprometer com o combate à violência e a desigualdade!
É mais do que urgente que esta casa não se cale sobre as vidas que são
interrompidas dia-a-dia neste Município.
Falar de igualdade de gênero é defender a vida!"
Marielle vive!
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