sábado, 18 de novembro de 2017

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS PERGUNTA: COMO FAÇO PARA VIVER NO BRASIL NOS DIAS ATUAIS?

No ano de 2013, o Jornal O Povo, de Fortaleza, publicou uma declaração do jurista Ives Gandra da Silva Martins, professor emérito da Universidade Mackenzie e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército (Eceme) e presidente do Conselho de Estados Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo. Na ocasião, o referido jurista falou sobre o politicamente correto, questionando o tratamento dado aos cidadãos que não fazem parte das minorias favorecidas com benefícios nos últimos anos.

Para sua reflexão, segue o texto na íntegra:


Não Sou: – Nem Negro, Nem Homossexual, Nem Índio, Nem Assaltante, Nem Guerrilheiro, Nem Invasor De Terras. Como faço para viver no Brasil nos dias atuais? Na …verdade eu sou branco, honesto, professor, advogado, contribuinte, eleitor, hétero… E tudo isso para quê?

Meu Nome é: Ives Gandra da Silva Martins* Hoje, tenho eu a impressão de que no Brasil o “cidadão comum e branco” é agressivamente discriminado pelas autoridades governamentais constituídas e pela legislação infraconstitucional, a favor de outros cidadãos, desde que eles sejam índios, afrodescendentes, sem terra, homossexuais ou se autodeclarem pertencentes a minorias submetidas a possíveis preconceitos. Assim é que, se um branco, um índio e um afrodescendente tiverem a mesma nota em um vestibular, ou seja, um pouco acima da linha de corte para ingresso nas Universidades e as vagas forem limitadas, o branco será excluído, de imediato, a favor de um deles! Em igualdade de condições, o branco hoje é um cidadão inferior e deve ser discriminado, apesar da Lei Maior (Carta Magna). 

Os índios, que pela Constituição (art. 231) só deveriam ter direito às terras que eles ocupassem em 05 de outubro de 1988, por lei infraconstitucional passaram a ter direito a terras que ocuparam no passado, e ponham passado nisso. Assim, menos de 450 mil índios brasileiros – não contando os argentinos, bolivianos, paraguaios, uruguaios que pretendem ser beneficiados também por tabela – passaram a ser donos de mais de 15% de todo o território nacional, enquanto os outros 195 milhões de habitantes dispõem apenas de 85% do restante dele. Nessa exegese equivocada da Lei Suprema, todos os brasileiros não-índios foram discriminados. Aos ‘quilombolas’, que deveriam ser apenas aqueles descendentes dos participantes de quilombos, e não todos os afrodescendentes, em geral, que vivem em torno daquelas antigas comunidades, tem sido destinada, também, parcela de território consideravelmente maior do que a Constituição Federal permite (art. 68 ADCT), em clara discriminação ao cidadão que não se enquadra nesse conceito. 

Os homossexuais obtiveram do Presidente Lula e da Ministra Dilma Roussef o direito de ter um Congresso e Seminários financiados por dinheiro público, para realçar as suas tendências – algo que um cidadão comum jamais conseguiria do Governo! Os invasores de terras, que matam, destroem e violentam, diariamente, a Constituição, vão passar a ter aposentadoria, num reconhecimento explícito de que este governo considera, mais que legítima, digamos justa e meritória, a conduta consistente em agredir o direito.

Trata-se de clara discriminação em relação ao cidadão comum, desempregado, que não tem esse ‘privilégio’, simplesmente porque esse cumpre a lei.. Desertores, terroristas, assaltantes de bancos e assassinos que, no passado, participaram da guerrilha, garantem a seus descendentes polpudas indenizações, pagas pelos contribuintes brasileiros. Está, hoje, em torno de R$ 4 bilhões de reais o que é retirado dos pagadores de tributos para ‘ressarcir’ aqueles que resolveram pegar em armas contra o governo militar ou se disseram perseguidos. E são tantas as discriminações, que chegou a hora de se perguntar: de que vale o inciso IV, do art. 3º, da Lei Suprema?

Como modesto professor, advogado, cidadão comum e além disso branco, sinto-me discriminado e cada vez com menos espaço nesta sociedade, em terra de castas e privilégios, deste governo.


quinta-feira, 16 de novembro de 2017

MARGARIDA SEM TERRA GANHA TORNOZELEIRA




Margarida sem terra ganha tornozeleira


Margarida é agricultora. Veio pra Rondônia atrás de um pedaço de terra. Achou terras devolutas e ocupou um pedaço, com mais 52 famílias. Viveu lá por 7 anos. Plantou, colheu, criou boi, porcos, galinhas. Nesse meio tempo, as terras de Rondônia valorizaram muito - a soja subia do Mato Grosso e o preço do hectare aumentou quase 30 vezes. Com a área limpa e o preço alto, logo apareceram os antigos donos, que já não tinham mais direitos. Mas, no Norte, direito e dinheiro andam de mãos dadas. O despejo de Margarida não tardou e foi violento. Desesperada e deprimida, sem ter pra onde ir, sofreu dois infartos seguidos de um câncer. Resolveu lutar e voltar a ocupar as terras públicas que eram dela. Foi recebida por pistoleiros do fazendeiro. Os companheiros reagiram e houve conflito, ficando um ferido de cada lado. Na justiça, foi acusada de formação quadrilha e lesão corporal. Pena de 9 anos e 10 meses. Está na penitenciária feminina de Vilhena. Hoje chegou a sua tornozeleira. Margarida continuará na luta. Não desistirá, apesar de tudo. No fim, chorei, chorei e chorei. Não há como não chorar quando a gente encontra pessoas nesse nível de sinceridade. Essa é a lição que a vida me deu hoje. Vamos em frente, ainda temos um país pra construir. #amazoniaocupada
Assinado: Frei da Comissão Pastoral da Terra


segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O HOMEM QUE DESCOBRIU 780 LÍNGUAS NA ÍNDIA


Correspondente da BBC na Índia
5 de novembro de 2017


Quando Ganesh Devy, um ex-professor de inglês, se aventurou a buscar as línguas existentes na Índia, esperava encontrar algo parecido com um cemitério de idiomas, repleto de línguas nativas mortas ou em vias de extinção.

Ele se deparou, no entanto, com uma "floresta densa de vozes", como ele mesmo descreve, uma estrondosa Torre de Babel, em um dos países mais populosos do mundo.
Descobriu, por exemplo, que há pelo menos 16 línguas faladas no Estado de Himachal Pradesh, na região do Himalaia. Só para a palavra "neve" há 200 formas diferentes - algumas bem descritivas, como "flocos que caem na água" ou "flocos que caem quando a lua está lá em cima".

Ele também encontrou comunidades nômades no deserto de Rajasthan, no oeste do país, que usavam uma grande quantidade de palavras para se referir à paisagem árida, chegando a descrever como os homens e animais a vivenciavam.

Outra descoberta foi que os nômades falam uma língua "secreta" devido ao estigma que carregam. Eles já foram considerados "tribos criminosas" pelos ingleses e agora sobrevivem vendendo mapas nos sinais de trânsito da capital Nova Deli.

Em dezenas de aldeias de Maharashtra, não muito longe de Mumbai, na costa oeste do país, Devy se deparou, inclusive, com pessoas falando um português antigo.

Em sua jornada, Devy identificou ainda um grupo de pessoas, no arquipélago de Andamão e Nicobar, que fala karen, uma língua étnica de Mianmar, além de índios do estado de Gujarat que falam japonês.

Segundo ele, os indianos usam cerca de 125 idiomas estrangeiros como se fosse sua língua materna.
Devy é um linguista autodidata que ensinou inglês em uma universidade de Gujarat por 16 anos. Em seguida, foi viver em uma aldeia remota, onde trabalhou com as tribos. Ajudou os nativos a terem acesso a crédito, a administrar bancos de sementes e projetos de saúde. Além disso, publicou uma revista em 11 línguas tribais.

Epifania

Foi por volta dessa época que começou a epifania de Devy em relação ao poder da linguagem.
Em 1998, ele levou a uma aldeia tribal 700 cópias de sua revista, escrita na língua local. Deixou os exemplares em uma cesta para quem quisesse ou tivesse como pagar 10 rupias (US$ 0,15) por uma cópia. No fim do dia, todas as revistas tinham desaparecido.

Quando voltou, Devy encontrou várias notas de dinheiro "sujas, amassadas, encharcadas" na cesta, deixadas pelos moradores da aldeia.

"Era provavelmente o primeiro material impresso na língua deles que tinham visto na vida. Eram trabalhadores que pagaram por algo que sequer conseguiriam ler. Me dei conta do poder e orgulho primordial da língua", conta.

 Há sete anos, Devy lançou seu ambicioso projeto Pesquisa Linguística do Povo da Índia (PLSI, na sigla em inglês), um levantamento nacional das línguas indianas e de como as pessoas as percebem.
O "caçador de línguas" realizou 300 viagens em 18 meses para todos os cantos da Índia. E financiou a jornada com o dinheiro que ganhou dando aulas. Ele viajou dia e noite, revisitando alguns estados até 10 vezes e manteve religiosamente um diário.

 Também criou uma rede de voluntários que contava com cerca de 3,5 mil estudiosos, professores, ativistas, motoristas de ônibus e nômades que viajavam às partes mais remotas do país.
Entre eles, estava o motorista de um burocrata do estado de Orissa, no leste do país, que anotava em um diário as palavras novas que ouvia durante a jornada.

Os voluntários entrevistavam as pessoas e registravam a história e a geografia de suas línguas. Além disso, pediam aos locais para "desenhar seus próprios mapas" do alcance de suas línguas.
"As pessoas desenharam mapas em forma de flores, triângulos ou círculos. Os mapas são uma representação do alcance imaginário de suas línguas", afirma.

Até 2011, o levantamento de Devy havia contabilizado 780 línguas, quase metade das 1.652 registradas pelo censo do governo em 1961. Já foram publicados 39 livros dos 100 planejados sobre os resultados da pesquisa.

Línguas 'mortas'

A Índia acabou perdendo centenas de línguas por falta de apoio do governo, pela redução do número de pessoas que falam os idiomas, pela educação primária fraca em línguas locais e devido à emigração de tribos de suas aldeias nativas.

A morte de uma língua é sempre uma tragédia cultural e marca o desaparecimento de todo o conjunto de conhecimentos, fábulas, histórias, jogos e músicas de um povo.

 Mas Devy alerta que as preocupações vão além. O partido do governo, o nacionalista BJP, se esforça para impor o hindu em todo território indiano, o que ele classifica como um "ataque direto à nossa pluralidade linguística".

Ele se pergunta como as megacidades conseguirão lidar com a diversidade linguística diante dessas políticas chauvinistas.

"Me sinto mal cada vez que uma língua morre. Mas sofremos perdas piores de diversidade, como as variedades de peixes ou de arroz", afirma.

"Nossas línguas sobreviveram por serem teimosas. Somos uma democracia linguística. Para manter nossa democracia viva, temos que manter nossas línguas vivas", acrescenta.

A espantosa variedade de línguas na Índia

  • O censo de 1961 registrou a existência de 1.652 línguas na Índia
  • A Pesquisa Linguística do Povo da Índia, conduzida por Devy, contabilizou 780
  • 197 delas estão ameaçadas, sendo 42 em estado crítico, segundo a Unesco
  • São 68 alfabetos em uso
  • O país publica jornais em 35 línguas
  • O hindu é a língua mais usada, falada por 40% da população. Em seguida, vêm bengali (8%), telugu (7%), marathi (6,9%) e tamil (5,9%).
Fonte: Censo da Índia, Unesco